Cirurgia bariátrica e metabólica
Cirurgia geral e do aparelho digestivo
CRM/RN 7863 - RQE 3148/4126/4837
Natal - RN

Podemos tratar as pedras na vesícula sem cirurgia?
13 de maio de 2021
Sabemos que a colecistectomia (retirada da vesícula biliar) é o tratamento indicado para os pacientes que possuem pedras na vesícula (colelitíase) que causem sintomas. A cirurgia tem o objetivo de prevenir novas crises de dor e complicações da colelitíase. Porém, nem toda pessoa encontra-se apta para ser submetida à operação, como por exemplo, pacientes com doença cardíaca avançada que não tolerem o trauma anestésico-cirúrgico, ou mesmo, pacientes que recusam a cirurgia. Para esses pacientes existem opções não-cirúrgicas de tratamento.
Embora as opções não-cirúrgicas não envolvam os riscos inerentes ao ato cirúrgico em si (anestesia, trauma e complicações cirúrgicas, etc), elas trazem três desvantagens principais: são medidas que exigem muito trabalho, geralmente são direcionadas para a dissoluçÃo dos cálculos de colesterol especificamente e possuem alta taxa de recorrência (quando a doença volta a acontecer).
Inicialmente, para estes pacientes, é importante que sejam orientados a identificar os sintomas de uma crise de vesícula, para que procurem um pronto socorro o mais precocemente possível, evitando uma evolução mais grave da doença.
O estudo das características dos cálculos biliares é importante, pois cada tipo demandará um tratamento não-cirúrgico específico. As características avaliadas são: constituição, formato, densidade radiológica, tamanho, padrão de calcificação, entre outros critérios. A forma da vesícula biliar e sua capacidade de se contrair e injetar a bile no intestino com o estímulo alimentar reflete a sua função motora, e tem grande importância na efetividade do tratamento não-operatório.
O objetivo do tratamento não-cirúrgico é reduzir a gravidade dos sintomas, limpar as pedras da vesícula biliar e assim reduzir o risco de complicações relacionadas a elas. A escolha do tipo de tratamento é baseada na apresentação clínica do paciente (a gravidade dos sintomas que ele apresenta), nas características dos cálculos e da vesícula biliar.
Uma das opções de tratamento para os pacientes com cálculos de colesterol na vesícula biliar, que apresentam sintomas sem complicações, é o ácido ursodeoxicólico por via oral. Este medicamento tem a capacidade de promover a dissolução do colesterol contido nas pedras, além de reduzir a absorção do colesterol no intestino e promover o esvaziamento da vesícula biliar. Desta forma, cálculos grandes, com baixo teor de colesterol e que possuam alto grau de calcificação, são mais difíceis de dissolver, muitas vezes requerendo anos de tratamento. Uma terapia longa e trabalhosa, com realização de exames de imagem a cada semestre, para avaliar a redução do tamanho dos cálculos.
Além disso, o ducto cístico (pequeno tubo que conecta a vesícula ao intestino) precisa estar desobstruído para que o medicamento possa fluir para o interior da vesícula e promover a dissolução dos cálculos de colesterol. Vesículas inflamadas cronicamente muitas vezes possuem o ducto cístico obstruído, impedindo este fluxo.
A taxa de sucesso do ácido ursodeoxicólico em dissolver pedras de 2 cm ou maiores varia de 30% a 50%. Uma metanálise de 23 trials randomizados evidenciou uma taxa de dissolução de 37%, com maior eficácia em cálculos flutuantes de colesterol. Um estudo de coorte mostrou a redução da recorrência das crises de cólica biliar em poucas semanas após o uso do ácido ursodeoxicólico, mesmo na presença dos cálculos. Outro estudo de baixo nível de evidência mostrou a tendência de redução dos sintomas relacionados aos cálculos num seguimento de 10 anos.
Terapias como a litotripsia extracorpórea por ondas de choque (um aparelho que quebra as pedras através da emissão de ondas sonoras), estatinas, ezetimibe e monoterpenes possuem eficácia limitada ou incerta.
Uma das principais preocupações em relação ao tratamento não-cirúrgico, mesmo nos pacientes que conseguem dissolver seus cálculos com este tratamento, diz respeito a sua recorrência (reaparecimento dos cálculos após algum tempo), com taxas de 45% e 60% para o ácido ursodeoxicólico e a litotripsia por ondas de choque respectivamente. Entretanto, o reaparecimento parece seguir a história natural da doença, com a maior parte dos cálculos biliares se apresentando em sua forma assintomática. O risco parece ser maior em pacientes que possuem múltiplos cálculos e em que o tempo para a completa dissolução foi mais longo.
A prevenção da recorrência pode ser feita através da prática de atividade física regular, hábitos alimentares saudáveis e a terapia de dissolução dos cálculos através do uso do ácido ursodeoxicólico por longo prazo.
O grande benefício da cirurgia para os casos de colelitíase sintomática sem complicações, embasada na alta taxa de resolutividade e baixas taxas de complicações e recorrência dos cálculos, quando comparado com o tratamento não-cirúrgico, reforça a conclusão de que a primeira seja a terapêutica de escolha.